“Lei da Devastação”: o retrocesso ambiental que ameaça o compromisso brasileiro com o clima e a biodiversidade
- Elias Fernandes

- 29 de out.
- 3 min de leitura

Um novo estudo, publicado na revista Perspectives in Ecology and Conservation, revela que a Lei nº 15.190/2025, sancionada em 8 de agosto, sob o argumento de “simplificação”, representa um dos maiores retrocessos institucionais da política ambiental brasileira. Conhecida como “Lei da Devastação”, a norma enfraquece instrumentos de controle, reduz a transparência e compromete o cumprimento das metas de biodiversidade e clima assumidas pelo Brasil em acordos como o Acordo de Paris e o Marco Global de Biodiversidade de Kunming–Montreal.
Principais pontos da nova lei
O artigo, intitulado “Shortcuts to Degradation: Environmental Consequences of Brazil’s General Environmental Licensing Law”, é assinado por mais de trinta cientistas do Centro de Conhecimento em Biodiversidade (INCT/CNPq/MCTI) e do Programa de Pesquisa em Biodiversidade do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação do MCTI. Segundo os autores, sob o pretexto de desburocratizar, a nova lei introduz o licenciamento autodeclaratório, autoriza a renovação automática de licenças e isenta amplamente atividades agropecuárias, restringindo a participação pública e enfraquecendo o direito de consulta de povos indígenas e comunidades tradicionais.
Os cientistas da biodiversidade e do clima destacam que não se opõem à modernização do licenciamento ambiental; ao contrário, apoiam medidas que reduzam burocracias, ampliem a transparência e fortaleçam a capacidade técnica dos órgãos ambientais. Como explica o professor Geraldo Fernandes, um dos pesquisadores envolvidos no estudo, o problema é que a nova lei não promove nenhum desses objetivos, mas dissolve salvaguardas fundamentais de proteção ambiental.
“Essa diluição das garantias que asseguravam um licenciamento rigoroso representa um retrocesso grave, que vai na contramão da proteção ambiental necessária para enfrentar os desafios atuais do clima e da biodiversidade”, afirma.
Entre os pontos mais críticos, o artigo 9º isenta atividades agropecuárias de licenciamento e o artigo 7º permite a renovação automática de licenças, abrindo espaço para a expansão descontrolada da fronteira agrícola e a regularização de passivos ambientais. O estudo ainda alerta que, ao transformar o licenciamento em um ato de confiança e não de análise técnica, o país entra em uma “zona cinzenta” de governança ambiental, em que as decisões passam a depender de interesses políticos.
Nova legislação favorece a fragmentação de habitats, a perda de vegetação nativa e a ampliação de empreendimentos ilegais. Fotos: Gabriel Arvelino
Impactos ambientais e institucionais
As consequências, apontam os autores, vão muito além do campo jurídico: a nova lei favorece a fragmentação de habitats, a perda de vegetação nativa e a ampliação de empreendimentos ilegais, ameaçando diretamente a resiliência dos ecossistemas brasileiros.
Às vésperas da COP30 em Belém, a aprovação da Lei nº 15.190/2025 lança uma sombra sobre a credibilidade do país diante da comunidade internacional, ao sinalizar um retrocesso institucional incompatível com as metas globais de clima e biodiversidade que o Brasil se comprometeu a liderar. Essa legislação fragiliza os alicerces da governança ambiental brasileira justamente quando o mundo espera do país exemplos de coerência entre discurso e prática em sustentabilidade.
Biodiversidade do país está em risco com a sanção da "Lei da Devastação". Fotos: Gabriel Arvelino
Ao substituir análise técnica por autodeclaração e reduzir transparência e participação social, o país compromete não apenas seus compromissos climáticos, mas também a confiança internacional em sua capacidade de proteger seus próprios ecossistemas. Em um momento em que o Brasil poderia reafirmar sua posição como potência ambiental e negociadora-chave da COP, a chamada “Lei da Devastação” expõe contradições profundas entre a política interna e o papel global que o país ambiciona desempenhar.















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