Restaura+ debate memória e reconstrução, dez anos após o desastre de Mariana
- Elias Fernandes

- 27 de out.
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Dez anos depois do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), o maior desastre socioambiental da história do Brasil, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) será palco de um amplo debate sobre os caminhos da restauração ambiental e social. Entre os dias 4 e 7 de novembro, o Centro de Atividades Didáticas 3 (CAD3), localizado no Campus Pampulha, vai sediar o Restaura+, um congresso sobre restauração ambiental em áreas degradadas por desastres antrópicos.
As inscrições ocorrem através do site do evento. Elas foram prorrogadas até o primeiro dia do evento e podem ser feitas tanto para participação presencial quanto para remota.
Lembrar para transformar
Organizado pelos projetos Biochronos e Terra-Água, com o apoio do Centro de Conhecimento em Biodiversidade (INCT/CNPq/MCTI) e das universidades federais de Minas Gerais (UFMG) e de Viçosa (UFV), o evento pretende revisitar a memória coletiva da tragédia para construir caminhos de regeneração mais rápidos e eficientes. O rompimento da barragem da Samarco, então controlada pela Vale e pela BHP Billiton, liberou mais de 50 milhões de metros cúbicos de rejeitos, soterrando comunidades, contaminando o Rio Doce e afetando diretamente o modo de vida de milhões de pessoas.
O Restaura+ propõe ir além da recordação da tragédia: o evento visa refletir sobre memória, ciência e reconstrução, entender os impactos duradouros e estimular ações concretas de recuperação ambiental e social. Segundo os organizadores, o evento busca fortalecer o diálogo entre cientistas, poder público e sociedade civil, consolidando uma agenda de políticas públicas voltadas à restauração da Bacia do Rio Doce e à prevenção de novos desastres.
Especialistas de diversas áreas apresentarão trabalhos em seis sessões temáticas, que vão do papel das barragens no modelo de mineração até políticas de conservação e manejo integrado. O evento será concluído com a leitura da “Carta da Ciência”, com recomendações para o fortalecimento da gestão ambiental da Bacia do Rio Doce.

Ciência e sociedade diante da catástrofe
No primeiro dia (04/11), a programação começará com a Sessão 1, que discutirá os limites do modelo atual de barragens e apontará alternativas para um futuro mais seguro, destacando a mineração sustentável, o cenário das barragens de rejeitos e a remediação de águas contaminadas. Em seguida, a Sessão 2 abordará a relação entre barragens e Saúde Única, discutindo riscos, biossegurança e emergências zoonóticas, como a resistência de vetores a metais pesados e protocolos de saúde, com ênfase na ecologia das zoonoses.
No segundo dia (05/11), a Sessão 3 tratará das consequências ecológicas do desastre de Mariana, com destaque para avanços na recuperação socioambiental, os efeitos na biodiversidade e nos processos ecológicos do solo e da vegetação, a vulnerabilidade da flora e fauna às mudanças climáticas, impactos sobre a fauna de artrópodes e avaliações da toxicidade em peixes e girinos.
Já no terceiro dia (06/11), a Sessão 4 discutirá a contaminação e as alterações nos ciclos da água e do solo após o desastre, com foco em metais tóxicos, tecnologias de remediação, resiliência da biodiversidade aquática, impactos costeiros e marinhos, além de observações hidrossedimentológicas. Complementarmente, a Sessão 5 abordará desafios socioambientais e caminhos para a conservação da Bacia do Rio Doce, ressaltando saberes e práticas dos povos e comunidades tradicionais, além das lutas dos atingidos. Ao final dessa sessão teremos o lançamento do livro “Doce amargo: um relato em quadrinhos do maior desastre ambiental do Brasil”, elaborado por João Marcos Mendonça.
No último dia (07/11), a Sessão 6 encerrará o congresso com debates sobre conservação, restauração e políticas públicas. Serão discutidos temas como a recuperação ambiental baseada em ciência, descomissionamento de barragens, o papel das Unidades de Conservação e as políticas multiescalares. A programação ainda contará com uma mesa-redonda final sobre funcionalidade, biodiversidade e resiliência, seguida da leitura da Carta da Ciência e do encerramento oficial. Representantes de diversos setores envolvidos no monitoramento, gestão e políticas públicas das regiões de Minas Gerais e Espírito Santo estarão presentes na sessão.
Além das sessões principais, durante os três primeiros dias, as apresentações de pôsteres acontecerão após o café da tarde, criando um espaço complementar para troca de conhecimento e visibilidade dos trabalhos submetidos.
Um futuro possível para o rio Doce
Foz do Rio Doce, no distrito de Regência, em Linhares (ES), no ano de 2019. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
A Bacia do Rio Doce é hoje um território de resiliência. Uma década após o rompimento, pesquisadores e comunidades continuam engajados na tarefa de reconectar o que foi afetado, as águas, os solos, a biodiversidade e as relações humanas. O Restaura+ simboliza essa força coletiva, reunindo diversas vozes para refletir sobre os aprendizados e os desafios que ainda precisam ser enfrentados.
O evento se encerra reafirmando a importância das políticas ambientais na retomada sustentável da bacia, por meio de uma mesa-redonda que reúne desde gestores públicos até lideranças comunitárias.
Mais do que um espaço de memória, o Restaura+ surge como um movimento de reconstrução coletiva. Relembrar Mariana, uma década depois, é confrontar as feridas abertas pelo rejeito, mas também reconhecer as sementes de transformação que brotam da resistência. A tragédia revelou os limites de um modelo e a urgência de outro - em que ciência, responsabilidade e solidariedade formam a base de um futuro mais seguro para todos.






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