Rejeitos de mineração e mudanças climáticas alteram ação de minhocas e travam regeneração florestal na Bacia do Rio Doce, revela estudo
- Elias Fernandes

- 17 de nov.
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Dez anos após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), considerado o maior desastre da mineração mundial, ecos do impacto ambiental ainda moldam a bacia do Rio Doce. Um estudo pioneiro, publicado na revista Biological Invasions, evidencia que os rejeitos de mineração, aliados às mudanças nos padrões de chuva, têm alterado as comunidades de minhocas, fundamentais para a saúde do solo, comprometendo a regeneração natural das florestas tropicais.
O estudo, intitulado “Mining and changes in rainfall patterns affect earthworm activity and impact the natural regeneration of tropical forests”, foi realizado por pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), Embrapa Florestas, Universidade Estadual de Maringá (UEM) e Centro de Conhecimento em Biodiversidade (INCT/CNPq/MCTI), e entregou a primeira análise temporal da diversidade de minhocas em áreas atingidas pela lama de rejeitos.
Impactos climáticos e ambientais na biodiversidade do solo
As minhocas, consideradas “engenheiras dos ecossistemas”, desempenham papel essencial na estruturação do solo por meio da aeração, infiltração de água e ciclagem de nutrientes, favorecendo o crescimento das plantas. Contudo, espécies invasoras dessas comunidades podem alterar a estrutura do solo de forma prejudicial, competindo com plantas jovens e comprometendo a regeneração vegetal.
A pesquisa comparou cinco regiões da bacia do Rio Doce, analisando 2.158 indivíduos de 15 espécies de minhocas (dez nativas e cinco invasoras) em áreas impactadas e áreas de referência conservadas. Os resultados apontaram que:
A diversidade de minhocas foi até nove vezes maior durante períodos de alta precipitação em comparação a períodos secos, indicando forte influência climática sazonal;
A composição das espécies variou principalmente por ganhos durante períodos chuvosos, quando minhocas saem do estado dormente e aumentam sua atividade;
Em áreas de floresta preservada, a abundância total de minhocas, incluindo invasoras como Pontoscolex corethrurus, correlacionou-se positivamente com a diversidade de plantas juvenis, sugerindo ajuda na regeneração;
Em áreas afetadas pelos rejeitos da mineração, essa correlação desapareceu, indicando falha na colaboração ecológica importante para a recuperação florestal;
A espécie invasora Pontoscolex corethrurus dominou em 86% dos indivíduos coletados, com alta resistência a distúrbios, mas não tem auxiliado na recuperação das plantas nas áreas impactadas.

Desafios para a restauração e recuperação dos ecossistemas
Esse cenário aponta para uma recuperação incompleta dos ecossistemas da bacia do Rio Doce, onde a perda da função ecológica das minhocas pode reduzir a fertilidade do solo e comprometer os processos naturais que deveriam favorecer a regeneração das matas. Por isso, os pesquisadores enfatizam a necessidade urgente de estratégias de recuperação que ultrapassem o reflorestamento convencional, incluindo monitoramento contínuo da fauna do solo como bioindicadores e políticas que estimulem a recolonização por espécies nativas e a reabilitação da funcionalidade do solo.
O estudo é um alerta contundente sobre os efeitos a longo prazo das grandes catástrofes ambientais e reforça a importância de considerar a biodiversidade subterrânea como parte essencial para a resiliência e recuperação dos ecossistemas pós-desastre.



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