Disparidade de investimentos entre clima e conservação
pode atrasar resposta do planeta
Cássio Cardoso Pereira, Geraldo Wilson Fernandes, Daniel Negreiros, Walisson Kenedy-Siqueira, Stephannie Fernandes, Philip M. Fearnside
As mudanças climáticas podem acelerar a perda de biodiversidade. A perda de biodiversidade associada a degradação do ecossistema prejudica a resiliência do mesmo ao diminuir o sequestro de carbono. Essa falha no sequestro de carbono, por sua vez, reflete na redução da mitigação das mudanças climáticas.
Embora sinergicamente interligadas, os tomadores de decisão e o público dedicam mais atenção às mudanças climáticas. Existe uma grande disparidade entre os recursos alocados para a mitigação das mudanças climáticas e os alocados para a conservação e restauração da biodiversidade.
A União Europeia (UE) gastou cerca de 201 bilhões de euros (mais de 1 trilhão de reais) entre 2014 e 2020 na mitigação das mudanças climáticas e planeja investir outros 118 bilhões de euros (mais de 624 bilhões de reais) entre 2021 e 2027, uma média de quase 23 bilhões de euros (mais de 120 bilhões de reais) por ano. Essa soma excede em muito o valor gasto em biodiversidade por toda a comunidade internacional, estimado entre 4 e 10 bilhões de dólares por ano (cerca de 50 bilhões de reais por ano). Ao financiar os esforços de biodiversidade, bem como as soluções para as mudanças climáticas, as cooperações internacionais podem oferecer uma resposta mais eficaz a ambos os desafios.
Recentemente, a comunidade internacional tomou medidas para melhorar o financiamento dos esforços para a conservação e restauração da biodiversidade. Na Sétima Assembleia do “Global Environment Facility” (Fundo Global para o Meio Ambiente) em Vancouver, Canadá, em 2023, 186 países concordaram em criar o “Global Biodiversity Framework Fund” (Fundo do Quadro Global de Biodiversidade) para aumentar o investimento na restauração e renovação da natureza.
O Canadá e o Reino Unido se comprometeram com contribuições iniciais de 200 milhões de dólares canadenses (742 milhões de reais) e 10 milhões de libras (mais de 650 milhões de reais), respectivamente. O fundo promete mobilizar recursos de fontes públicas, privadas e filantrópicas, com foco na biodiversidade e na sustentabilidade dos ecossistemas.
Esse fundo de biodiversidade permitirá o investimento na proteção essencial dos ecossistemas naturais, que também servirá como uma forma economicamente eficaz de mitigar as mudanças climáticas. Por exemplo, todas as “unidades de conservação” (áreas protegidas) do Brasil foram criadas para preservar a biodiversidade, mas elas proporcionam importantes benefícios climáticos ao manter os estoques de carbono e a reciclagem de água.
Embora o objetivo imediato seja proteger os estoques de carbono existentes em ecossistemas intactos, a vegetação terrestre global pode sequestrar mais 13,7 gigatoneladas de carbono por ano se forem adotadas práticas adicionais de gestão. Além disso, os animais selvagens e suas funções no ecossistema são componentes essenciais das soluções climáticas naturais que podem sequestrar 6,5 gigatoneladas de carbono por ano.
A biodiversidade e a funções dos ecossistemas devem ser incluídas nas respostas às mudanças climáticas, inclusive nas discussões sobre alocação de recursos durante a COP Clima 28, que começa em 30 de novembro deste ano, bem como na COP Biodiversidade 16 e na COP Clima 29, ambas programadas para 2024. É imprescindível concentrar-se igualmente nessas questões para garantir uma distribuição equilibrada dos recursos econômicos, refletindo sua importância e impacto equivalentes sobre a humanidade.
Acesse a publicação na revista Science clicando aqui.
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